Tudo sobre as Eleições 2018
PUBLICIDADE
Notícias falsas

Justiça Eleitoral acreditou que tinha condições de combater as fake news. Não deu certo

Últimos presidentes do TSE menosprezaram o alcance das fake news e o risco que elas representavam para as eleições. Agora parece tarde demais para consertar qualquer estrago

Débora Álvares, de Brasília
Justiça Eleitoral acreditou que tinha condições de combater as fake news. Não deu certo
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Compartilhar

Faltavam seis dias para o segundo turno e o Conselho Consultivo criado há mais de dez meses por uma portaria do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se reunia com agências de checagem de informação para ouvir sugestões para o combate às fake news. Um dia antes, domingo (21), a presidente da Corte Eleitoral, Rosa Weber, negou erros da justiça na atuação contra as notícias falsas, mas admitiu que não esperava que “a desinformação se voltaria contra a instituição”.

Rosa “pegou o bonde andando” e não quis tomar o assunto para si, é o que se diz nos bastidores do tribunal. Assumiu o comando do TSE com a campanha eleitoral já em curso, em 14 de agosto. Em sua posse, fez uma única menção às fake news, quando se dirigiu ao antecessor Luiz Fux. E assim permaneceu até que foi obrigada a responder sobre o impacto do movimento, que tomou conta do noticiário, das redes sociais e aplicativos de mensagens, especialmente após reportagem da Folha de São Paulo sobre a suspeita de compra de disparos em massa de mensagens anti-PT pelo WhatsApp.

LEIA TAMBÉM: Como o WhatsApp mobilizou os eleitores – para o bem e para o mal

As fake news, porém, foram assunto da gestão de Luiz Fux. Ele firmou acordo de colaboração e compromisso com 31 partidos – apenas PT, PCO, PSTU e PTC não assinaram – e com plataformas como Google e Facebook, além de empresas jornalísticas e de marketing político. “As notícias falsas representam a ira de um candidato contra o outro em vez de revelar as suas próprias virtudes. E isso é absolutamente intolerável no sistema democrático”, afirmou Fux em meados de junho.

Em seis meses à frente do tribunal, Fux tratou a questão no campo dos acordos e termos de compromisso. Mas não dotou o tribunal de instrumentos tecnológicos que pudessem, de fato, combater as fake news. A avaliação é de quem acompanhou o fim da gestão do ministro Gilmar Mendes, seguiu atento aos movimentos no TSE com Fux e ainda monitora as coisas por lá.

Foi Mendes, que deixou o tribunal em fevereiro, quem decidiu levar a questão das fake news para o TSE. Em 9 de dezembro, quando ele já estava para deixar a Justiça Eleitoral, instituiu o Conselho Consultivo sobre Internet e Eleições. Também nos bastidores, dizem que foi uma “casca de banana” para seu sucessor que, por sinal, nunca mais mencionou fake news após deixar a cadeira na Corte. Gilmar Mendes e Luiz Fux não chegam a ser desafetos, mas não são melhores amigos. As consequências, porém, sobraram para Rosa Weber. “Ela herdou uma expectativa criada em torno de combate que não tem arcabouço de ferramentas”, afirmou uma fonte.

LEIA TAMBÉM: Escalada de ataques verbais deixa STF em alerta para proteger Constituição

Expectativa

O que se tem agora, porém, é uma Justiça Eleitoral no olho do furacão, com um Conselho reforçado. Inicialmente esse grupo era formado, além do TSE, por representantes do Exército; do Ministério da Justiça; da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); do Comitê Gestor da Internet no Brasil; do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações; da Safernet Brasil e da Fundação Getúlio Vargas.

Agora também participam das reuniões, a Advocacia-Geral da União (AGU), o Ministério da Segurança Pública, a Polícia Federal e o Ministério Público Eleitoral (MPE).

Eles estarão reunidos nesse fim de semana monitorando não apenas a segurança das eleições em todo o país e a apuração das urnas no domingo (28), mas o movimento das fake news, como fizeram ao longo de toda a semana.

A condução da ministra Rosa Weber diante do fenômeno das notícias falsas chegou a ser alvo de críticas dos próprios colegas. Mas, com os ataques diretos ao Supremo Tribunal Federal, ao TSE e a ela própria, formou-se uma união de todo o Judiciário em prol de reforçar as instituições.

Foi esse o principal tom da coletiva de imprensa do último fim de semana. E é essa a tendência de todas as falas que se seguirão neste sábado (27) e no domingo (28). Rosa vai ressaltar mais uma vez a segurança do processo eleitoral e das urnas eletrônicas. Sobretudo, porém, deve pedir aos brasileiros que confiem na Justiça Eleitoral.

LEIA TAMBÉM: A facada que mudou a eleição: o que se sabe sobre o atentado que turbinou a onda Bolsonaro

Cronologia 

Relembre os fatos mais importantes sobre fake news e o impacto dessas notícias no processo eleitoral brasileiro.

22/10/18 – Conselho Consultivo se reúne com representantes de agências de checagem de informação (fact-checking), de redes sociais e de aplicativos on-line para conhecer a atuação na prevenção e no combate à disseminação de notícias falsas e ouvir sugestões contra a propagação de fake news.

– A presidente do TSE, Rosa Weber, reuniu-se com os presidentes dos TREs do país para tratar das medidas implementadas no combate às fake news e destacou a criação de uma página, no portal do tribunal, para esclarecer eleitores sobre a veracidade de fatos.

21/10/18 – Em entrevista coletiva, Rosa Weber afirmou que não havia a noção de que as fake news se voltariam contra a instituição, mas negou ter havido falhas da Justiça Eleitoral na condução da questão. Por outro lado, disse que a novidade é a velocidade de propagação das informações e que “ainda não descobrimos um milagre”.

10/10/18 – Primeira reunião do Conselho Consultivo durante a campanha eleitoral e na gestão da ministra Rosa Weber. Principal assunto foi o impacto das fake news no primeiro turno e discussões sobre como tratar o tema nas semanas seguintes

14/8/18 – Rosa Weber toma posse no comando do TSE e faz uma única menção às fake news, quando se dirige ao antecessor Luiz Fux dizendo que o magistrado, com sua equipe, pavimentou “de forma atenta e minuciosa o caminho a ser trilhado nestas eleições, incansável no combate às fake news, aspecto dos mais deletérios e preocupantes na guerra à desinformação”.

DESEJOS PARA O BRASIL: Democracia aprofundada, com uma política moralmente exemplar

13/8/18 – Fux diz que foram tomadas providências efetivas no combate às fake news. Ele destacou o limite da liberdade de expressão quando se trata de notícias falsas. “A liberdade de expressão também é mitigada se estiver a serviço da deletéria prática das fake news”.

9/7/18 – Ao todo, 31 partidos assinaram o acordo de colaboração firmado pelo TSE contra fake news, em que “se comprometem a manter o ambiente de higidez informacional, de sorte a reprovar qualquer prática ou expediente referente à utilização de conteúdo falso no próximo pleito”. Foram: AVANTE, DC, DEM, MDB, PCB, PCdoB, PMB, PR, PSDB, PDT, PHS, NOVO, PPL, PP, PRB, PROS, PRP, PSC, PSD, PSL, PSOL, PSB, PTB, PV, PATRI, REDE, SD, PMN, PMB, PRTB e PODE. Não assinaram até a data: PCO, PT, PSTU e PTC.

28/6/18 – Google e Facebook assinaram dois memorandos de entendimento com o TSE assumindo compromisso de prevenir e combater a desinformação gerada por terceiros

20/6/18 – Luiz Fux reiterou a importância do jornalismo profissional no combate a ações de desinformação nas eleições. “Contra notícias falsas, nós precisamos de mais imprensa e mais jornalismo. As notícias falsas representam a ira de um candidato contra o outro em vez de revelar as suas próprias virtudes. E isso é absolutamente intolerável no sistema democrático”, completou o ministro.

19/6/18 – TSE firmou parceria com representantes do Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (Camp), que se compromete em não criar e disseminar conteúdos falsos e contribuir para campanha limpa.

6/2/18 – Ao tomar posse, Fux colocou o combate às fake news como prioridade de sua gestão e afirmou que os exemplos de eleições no exterior evidenciam que os candidatos preferem destruir a honra alheia através de notícias falsas por meio de redes sociais em vez de revelar as próprias aptidões e qualidades. “O papel do TSE é o de neutralizar esses comportamentos anti-isonômicos e abusivos”, explicou.

1/2/18 – Em sua última sessão no comando do TSE, Gilmar Mendes falou mais uma vez sobre fake news e advertiu que é preciso regular o setor (internet e mídias sociais), mas sem que afetar a liberdade de expressão. “A verdade é que não há respostas simples para problemas complexos. As novas vicissitudes exigem de nós adaptação constante”.

31/1/18 – Em mais uma reunião do Conselho Consultivo para debater fake news, representantes do Facebook, do Google, do Twitter e do WhatsApp mostraram quais ações estão sendo implementadas em suas empresas para combater notícias falsas que são disseminadas nas redes sociais.

13/12/17 – Gilmar Mendes esteve nos EUA e discutiu sobre fake news com a vice-presidente da Federal Election Commission, Ellen Weintraub. “Esses crimes cibernéticos são transnacionais. Então, precisamos de cooperação internacional. Nós conversamos com os Estados Unidos e continuamos a avançar nisso. É um tema muito delicado. De um lado, a liberdade de expressão e, de outro, a informação abusiva e, às vezes, criminosa. Os nossos instrumentos hoje se tornaram obsoletos”, afirmou na ocasião.

11/12/17 – Primeira reunião do Conselho Consultivo sobre Internet e Eleições. Discutiu-se a necessidade de criação de cartilhas e campanhas de conscientização para a população, elaboração de manuais de procedimentos para os juízes eleitorais, criação de um ambiente virtual (site ou aplicativo) para recebimento de sugestões de atuação e denúncias sobre fake news, e análise das propostas de resolução do TSE a fim de apresentar colaborações.

9/12/17 – TSE publica portaria que cria Conselho Consultivo sobre Internet e Eleições e leva discussão do tema para dentro do tribunal. Além de representantes da Corte, reúne também representantes do Exército; do Ministério da Justiça; da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); do Comitê Gestor da Internet no Brasil; do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações; da Safernet Brasil e da Fundação Getúlio Vargas. O objetivo primeiro é: “desenvolver pesquisas e estudos sobre as regras eleitorais e a influência da internet nas eleições, em especial o risco das fake news e o uso de robôs na disseminação das informações”.

Compartilhar
PUBLICIDADE