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Eleições

Escalada de ataques verbais deixa STF em alerta para proteger Constituição

Em semana marcada por ataques diretos ao Supremo e a ministros da Corte, sentimento no STF é que será preciso travar batalha para garantir ordem constitucional, independentemente do candidato que for eleito

Débora Álvares, de Brasília
Escalada de ataques verbais deixa STF em alerta para proteger Constituição
Policiais fazem guarda em frente ao prédio do Supremo Tribunal Federal: escalada de ataques preocupa. Foto: Lula Marques/ Agência PT
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A eleição mais polarizada desde a redemocratização do Brasil tira o sono do Supremo Tribunal Federal (STF) há meses. Nos bastidores, o sentimento é de que caberá à Corte cuidar para que os preceitos constitucionais sejam respeitados, independentemente do candidato a presidente que for eleito no próximo domingo (28). Existe, também, a consciência de que será preciso travar uma verdadeira batalha para garantir a ordem constitucional e a democracia. Isso antes mesmo dos ataques frontais que o STF e seus ministros foram alvo nessa semana.

Internamente, o tom usado pelos candidatos neste pleito já era considerado fora do usual. O tribunal já tinha sido alvo de críticas e ameaças abertas em outras ocasiões. Como no vídeo em que o deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) defende “fechar o STF”; na intenção de Jair Bolsonaro (PSL) de aumentar o número de ministros de 11 para 21 e indicar aqueles que têm o “perfil de Sergio Moro”; e ainda, mais recentemente, na declaração do general da reserva Eliéser Girão Monteiro (PSL-RN), eleito deputado federal, que falou em impeachment e prisão de ministro da Suprema Corte que decidir ou votar pela libertação de políticos investigados em casos de corrupção.

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Parte dos ministros está atenta aos movimentos externos, mas também aos internos, da presidência da Corte. Antes mesmo de tomar seu lugar no comando do STF, o ministro Dias Toffoli começou a fazer uma série de acenos aos outros poderes e às Forças Armadas. Tem falado, por exemplo, em criar uma interlocução com o novo presidente da República e com o Congresso eleito. Não há críticas diretas à postura do presidente, mas avaliações de razoabilidade.

Alguns ministros mencionam a nomeação, por Dias Toffoli, do general Fernando Azevedo e Silva, ex-chefe do Estado Maior, que vai assessora o gabinete da presidência. Toffoli disse na ocasião, via assessoria, que “a escolha obedeceu a critérios objetivos de habilidades e competências”. A medida foi vista com ressalvas, especialmente após o presidente do STF ter afirmado que o golpe de 1964 foi, na verdade, um “movimento”. Alguns ministros interpretaram a declaração como um aceno aos militares. Oficialmente, Toffoli nega e diz já ter escrito sobre isso em artigos anteriormente.

Vídeo de Bolsonaro filho contra o STF causou reação dura

Os alertas soaram – ou em alguns casos se tornaram mais audíveis – com a divulgação de novos vídeos nessa semana com investidas diretas ao STF e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), corte que tem em sua composição ministros do próprio Supremo. Mas, ao contrário do que vinha ocorrendo até agora, dessa vez o tribunal não se calou.

O primeiro, do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do candidato Jair Bolsonaro, falou em fechar o Supremo caso uma decisão impedisse o pai de disputar a Presidência ou assumir o cargo em caso de ser eleito. A afirmação aconteceu antes do primeiro turno, durante palestra em um cursinho no Paraná para concurso da Polícia Federal.

“Para fechar o STF não manda nem um jipe, manda um soldado, um cabo. Não é querer desmerecer o soldado e o cabo não. Se você prender um ministro do STF, você acha que vai ter uma manifestação popular?”, disse, causando grande repercussão.

A reação pública não foi imediata. Os ministros combinaram internamente que caberia ao decano, Celso de Mello, e ao presidente da Corte, Dias Toffoli, responderem pelo tribunal. E assim foi. Primeiro Mello, que em nota dura enviada ao jornal Folha de S. Paulo chegou a classificar a fala de “golpista”.

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“Essa declaração, além de inconsequente e golpista, mostra bem o tipo (irresponsável) de parlamentar cuja atuação no Congresso Nacional, mantida essa inaceitável visão autoritária, só comprometerá a integridade da ordem democrática e o respeito indeclinável que se deve ter pela supremacia da Constituição da República”.

Para o decano, “votações expressivas do eleitorado não legitimam investidas contra a ordem político-jurídica fundada no texto da Constituição”. Eduardo foi o deputado federal mais votado nesta eleição.

Toffoli só se manifestou no dia seguinte – estava representando o STF em evento em Veneza, na Itália –, também em nota, porém curta, oficial, na qual afirmou que “atacar o Poder Judiciário é atacar à democracia”. Segundo o ministro, o “Supremo Tribunal Federal é uma instituição centenária e essencial ao Estado Democrático de Direito. Não há democracia sem um Poder Judiciário independente e autônomo. O país conta com instituições sólidas e todas as autoridades devem respeitar a Constituição”.

Mais ataques, mais reações

Um outro vídeo passou do ponto. O coronel reformado do Exército Carlos Alves atacou a ministra Rosa Weber, também presidente do TSE, chamando-a de “salafrária, corrupta e incompetente”.

O militar disse que derrubaria o TSE caso o tribunal desse segmento à denúncia de que a chapa de Bolsonaro cometeu abuso de poder econômico em um suposto esquema de envio de mensagens pelo WhatsApp. E sugeriu, ainda, que uma derrota do candidato do PSL será comprovação de que há fraude nas urnas eletrônicas.

A reação foi imediata. Na terça-feira (23), as sessões das duas turmas do Supremo foram tomadas por discursos de apoio à ministra. Novamente o decano, Celso de Mello, tomou a frente e classificou o discurso do coronel aposentado como “imundo, sórdido e repugnante”. Disse ainda que ele se valeu de “linguagem desqualificada e superlativamente grosseira e boçal, próprias de quem possui reduzidíssimo e tosco universo vocabular”.

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Para o decano do STF, o militar ultrapassou os limites da liberdade de expressão. “O primarismo vociferante deste ofensor da honra alheia faz-me lembrar dos personagens patéticos que, privados da capacidade de pensar com inteligência, optam por manifestar ódio visceral e demonstrar intolerância radical contra os que consideram seus inimigos, expressando, na anomalia dessa conduta, a incapacidade de conviver em harmonia e com respeito pela alteridade, no seio de uma sociedade fundada na democracia.”

Houve ainda manifestações de Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Luís Roberto Barroso. Além disso, o Comando do Exército divulgou nota de repúdio à manifestação do coronel reformado e pedindo que o Ministério Público Militar investigasse a conduta dele. Na quarta (24), o comandante, general Villas Bôas enviou flores à ministra Rosa Weber em nome da corporação.

Mas as ofensas não pararam. Em outro vídeo, o coronel Alves voltou a atacar, desta vez o ministro Gilmar Mendes, chamando-o de “criminoso” e ainda de “receber suborno e propina para liberar habeas corpus”. “Todo mundo sabe, está na mídia, e eu posso processá-lo por estar me ameaçando. Eu não sou qualquer um. Sou um coronel do Exército. Do seu Exército. Estou cumprindo meu papel constitucional em defesa de homens como você. (…) Todo mundo sabe das suas falcatruas. Gilmar Mendes, criminoso. Não é digno de ser chamado de juiz”.

No mesmo vídeo, o coronel aposentado diz que o PT vai forjar um atentado. “Atenção senhores generais, da ativa e da reserva, atenção comandantes, atenção brigadeiros. Agora eles estão indo longe demais. Essa semana, amanhã ou depois, Manuela D’Ávila sofrerá um atentado e [Fernando] Haddad. Tudo planejado pelo PT para colocarem a culpa em [Jair Bolsonaro]. Eles não vão deixar o PT perder de graça”, afirmou.

A Polícia Federal abriu inquérito para investigar o coronel.

Ministros veem com ressalvas interferências nas universidades

Uma série de decisões da Justiça Eleitoral, nessa semana, contra propagandas e eventos supostamente eleitorais em universidades do país motivou novas manifestações públicas de ministros do STF nesta sexta-feira (26).

Marco Aurélio Mello afirmou que toda interferência na autonomia das universidades é, de início, “incabível”. Ele ressaltou que a universidade é “campo do saber”, característica que pressupõe liberdade “no pensar” e de “expressar ideias”.

Apesar de ressalvar que seu pronunciamento não se refere especificamente sobre a atuação da Justiça Eleitoral nos casos, Marco Aurélio destacou que a “quadra é de extremos” e “perigosa”. Para o ministro, é preciso que a Justiça tenha cautela, para que a situação não chegue a extremos.

Gilmar Mendes disse que a Justiça precisar ter “cautela” para evitar exageros. “É preciso que façamos uma reavaliação para não valorizarmos uma ação repressiva e que possamos valorizar uma relação mais dialógica. Nós precisamos ter uma relação dialógica e menos repressiva”, disse, em São Paulo.

Luis Roberto Barroso afirmou à jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, que não falaria sobre o caso concreto, mas “o modo como penso a vida, a polícia, como regra, só deve entrar em uma universidade se for para estudar”. Ele está na Colômbia, participando de uma palestra sobre os 30 anos da Constituição brasileira.

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