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Uma economia rica e competitiva

A produtividade deveria ser um objetivo nacional

É forte no Brasil o discurso de que vivemos em um país naturalmente rico, com sua área continental, imensa biodiversidade e grande mercado interno. O problema é encontrar essa riqueza nos números. Na verdade, essa visão sobre o Brasil limita a discussão sobre o que realmente torna uma nação afluente: a produtividade de sua economia.

A riqueza está associada ao quanto um povo produz com o capital que possui. Conforme a produtividade cresce, as nações acumulam mais capital na forma de máquinas e conhecimento (patentes, instrução para sua população e assim por diante). Nada disso vem sem esforço, embora ninguém possa reclamar, é claro, de ter em seu quintal os recursos naturais de que o Brasil dispõe.

“A fórmula para o crescimento, portanto, é uma somatória de maior abertura comercial, redução de barreiras à concorrência, aumento do investimento e da inovação.”

Se quisesse procurar inspiração, o Brasil talvez devesse olhar para os países que são seu oposto: pequenos, com poucos recursos naturais e com mercados internos limitados. Um estudo feito pelo banco Credit Suisse em 2015 mostrou como países pequenos estão na frente na corrida pelo desenvolvimento. Cruzando dados sobre desenvolvimento humano, infraestrutura intangível, integração ao resto do mundo, volatilidade da economia e governança, os pesquisadores criaram um Índice de Força. Dos 20 melhores colocados, 13 são pequenos – a liderança ficou com a Suíça.

O que países como Dinamarca, Noruega, Irlanda, Áustria e Israel têm a ensinar? Por causa da necessidade imposta por suas dimensões, eles têm mercados mais abertos, buscam exportar mais e se especializam em áreas que exigem muito conhecimento, como as indústrias farmacêutica e química. Esses países também têm uma gestão econômica mais prudente para lidar com as flutuações de mercados nos quais precisam antecipar os movimentos das maiores economias.

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A combinação de abertura, investimento em inovação e estabilidade não seria um mau conselho para o Brasil. Ao analisar as razões para o baixo avanço da produtividade (e, por consequência, do crescimento da riqueza) no país, economistas do Banco Mundial que participam de um projeto de diagnóstico sobre o Brasil contratado pelo próprio governo brasileiro chegaram a conclusão semelhante.

O diagnóstico feito pelo Banco Mundial chama a atenção para o fato de a produtividade total dos fatores (PTF), que resume a eficiência com que são empregados os componentes da produção (capital e trabalho), ter caído 1% no período de 1996 a 2013. Todo o crescimento econômico do período veio da inclusão de mais trabalhadores na força de trabalho, de um pequeno ganho na produtividade do trabalho (derivado de melhorias na educação e da migração da mão de obra entre setores) e do investimento, baixo para um país emergente. Não é à toa que o crescimento da economia brasileira é errático.

Solução pela abertura

Para os economistas do Banco Mundial, o Brasil padece da doença da baixa competição. Fizemos o contrário do que os pequenos países que se desenvolveram: fechamos a economia ao comércio, impomos barreiras à competição, investimos pouco na integração (interna e externa), não buscamos com afinco o acúmulo de conhecimento e a inovação, e não temos regras do jogo e uma gestão econômica estáveis.

A integração da economia brasileira ao resto do mundo é bastante limitada. A corrente de comércio, que soma exportações e importações, soma apenas 24,6% do PIB, contra uma média mundial de 51,3%. O Brasil impõe tarifas médias de importação de 8,3%, a maior entre emergentes, e protege alguns setores com taxas de 35%, como no caso do setor automotivo. O país é um dos que mais impõem sobretaxas para proteger indústrias e um dos líderes em medidas não-tarifárias. É sintomático que 89% dos produtos que podem ser importados estão sujeitos a barreiras técnicas.

A redoma que protege empresas instaladas no Brasil também é composta por regras de conteúdo local (somos o segundo país com mais regras desse tipo, 17), subsídios à produção nacional (principalmente via crédito direcionado e isenções fiscais), regras aduaneiras antiquadas e baixa adesão a acordos comerciais. O resultado é que as empresas brasileiras têm poucos incentivos para usar melhor seus recursos e praticam preços médios mais altos do que no mercado global, o que no fim da linha significa que os consumidores ficam mais pobres.

A solução para esse nó é a maior competição. O Banco Mundial fez várias simulações sobre os efeitos de uma abertura comercial sobre a economia brasileira. Uma redução de 50% nas tarifas comuns do Mercosul, de forma unilateral, levaria a um aumento real do PIB de 0,93%. Ganhos do gênero decorreriam de acordos com a União Europeia e com a Aliança do Pacífico. O melhor é que um movimento nessa direção traria benefícios aos mais pobres. Na simulação do acordo dentro do Mercosul, os economistas calculam que 6 milhões de pessoas sairiam da situação de miséria no Brasil.

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Um estudo publicado em 2017 pelo pesquisador do Ipea Alexandre Messa investigou os efeitos protecionismo sobre a produtividade, concluindo que as barreiras não tarifárias impostas pelo Brasil neutralizam os efeitos do investimento sobre a produtividade. Em outras palavras, é inútil investir em novas tecnologias em um ambiente sem competição porque seus ganhos não são suficientes para a produtividade avançar.

Abrir a economia, portanto, com a redução de tarifas ou acordos, tem efeitos multiplicadores. Faz com que o investimento seja mais eficiente, torna mais atraente a adoção de novas tecnologias e eleva a produtividade e, com isso, a riqueza do país. No processo, empresas menos eficientes ficariam pelo caminho, o que precisa ser compensado por políticas de apoio para a recolocação da mão de obra e recuperação de regiões mais afetadas.

Menos distorções

Além de abrir sua economia, o Brasil deveria adotar uma pauta de redução de distorções que beneficiam setores e empresas e reduzem a competição. As exigências de conteúdo nacional, como a que existe no setor de óleo e gás, são um exemplo de barreira que dificulta a entrada de competidores mais eficientes no mercado. O argumento da indústria de equipamentos, de que são gerados empregos ou novas tecnologias a partir dessas exigências, ignora a perda disseminada pela economia que advém dos preços mais altos cobrados pelas empresas protegidas.

Outra distorção que precisa ser amplamente revista é a concessão de benefícios fiscais e subsídios. Só em renúncias ficais, ou seja, de impostos que deixaram de ser cobrados de empresas beneficiadas, a União abriu mão de R$ 276 bilhões em 2017, segundo o Relatório Fiscal do Tesouro Nacional. São 4,1% do PIB que deixam de ser recolhidos em impostos e, no fim, são cobrados dos contribuintes que não são beneficiados, em um processo de transferência de renda. O pior é que 84% dessas isenções não têm prazo para acabar e não passam por avaliações sobre seus efeitos econômicos.

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Também abundam no país mecanismos de subsídios, alguns deles cruzados (como a cobrança da Cide sobre a gasolina para subsidiar programas ligados ao etanol e o gás natural), e outros em fundos constitucionais que direcionam recursos a baixo custo para regiões ou setores específicos. Nenhum desses mecanismos passa por uma avaliação criteriosa de seus resultados. Existem também encargos que encarecem serviços com objetivos que são opacos para os consumidores – uma simples conta de luz tem 14 encargos setoriais cuja destinação é conhecida apenas por especialistas e burocratas.

Outra distorção está no mercado de crédito, na forma do direcionamento de recursos decidido em lei e que ocupa aproximadamente metade do mercado. Isso significa que setores beneficiados por esse crédito têm acesso a recursos com juros mais baixos e prazos mais longos, enquanto quem está fora arca com custos maiores do que veríamos em um mercado livre de intervenções. O crédito direcionado precisa ser usado apenas para corrigir imperfeições de mercado, como o atendimento a empresas em busca de microcrédito, e mesmo nesses casos precisa de uma avaliação constante de seu custo-benefício.

A remoção de barreiras à competição também envolve uma reforma tributária para simplificar a vida das empresas e harmonizar normas entre estados. Aliado a mais investimento na infraestrutura de transportes, esse seria um passo que aumentaria a integração do mercado interno e permitiria que empresas hoje regionais se nacionalizassem.

Investir mais e melhor

A integração do mercado interno e do país ao mercado internacional demanda investimentos em duas frentes. Uma é a da infraestrutura, importante para reduzir custos de produção e transporte. A outra é a do capital humano, necessária para acelerar a produtividade do trabalho, a inovação e permitir a realocação de trabalhadores deslocados dos setores que porventura sejam prejudicados pela maior liberdade comercial, ou pela redução de subsídios.

O investimento brasileiro em infraestrutura vem caindo nos últimos anos, somando menos de 1,5% do PIB no ano passado. Esse valor já foi de 5% do PIB nos anos 70 e hoje está longe de cobrir as necessidades básicas do país em logística, saneamento, energia e telecomunicações. A falta de investimentos tem um custo para empresas e consumidores e deixa o Brasil em desvantagem crescente no mercado global. Em 2010, o país ocupava a 41ª colocação no ranking do Índice de Performance Logística calculado pelo Banco Mundial. Em 2016, havia caído para a 55ª posição, atrás de outros emergentes, como Índia e Tailândia.

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No total, o investimento na economia brasileira caiu no último ciclo recessivo para cerca de 17% do PIB. Esse indicador precisa subir para uma meta de 22% a 25% do PIB para a ampliação da infraestrutura, aplicação de recursos na modernização de sua indústria e aceleração da inovação. Para esse salto de 5 a 8 pontos do PIB, o melhor caminho é o casamento de um ajuste fiscal, que reduza o uso da poupança interna para o custeio da máquina do governo, com um amplo programa de concessões e privatizações.

Nos últimos anos, os governos fizeram avanços na área de concessões, mas é preciso mais velocidade e abrangência. É possível acelerar a concessão de áreas nos portos, processo iniciado no ano passado, terminar a privatização dos aeroportos com a saída da Infraero dos terminais já concedidos e a concessão dos que ainda ficaram nas mãos do governo, e rever o planejamento para o setor ferroviário. Nesse último caso, o novo governo terá de encontrar uma fórmula para a finalização da Ferrovia Norte-Sul e cobrar investimentos vultosos para a renovação das linhas cujas concessões estão chegando ao fim. É importante que todos esses processos sejam planejados de forma integrada, atendendo à necessidade de integração interna e redução de custos para o comércio internacional.

Nesse processo de retomada de investimentos, o BNDES terá de consolidar um novo papel: de vetor para a mobilização de capital privado e de investidor em indústrias nascentes, juntamente com a Finep. Uma sugestão feita por economistas da OCDE que analisaram o caso brasileiro é a de que o banco ajude a reduzir o risco do investimento privado com a criação de instrumentos financeiros, em vez de entrar com o grosso do dinheiro como no passado.

Sem precisar bancar os subsídios de planos anteriores de investimentos, o governo federal terá mais capacidade para organizar a estrutura de formação e treinamento de mão de obra. O país gasta pouco mais de 1% do PIB em políticas voltadas ao trabalho, a maior parte como subsídio ao emprego pouco qualificado em programas como o abono salarial. Seria melhor mudar o foco para a capacitação de trabalhadores.

Ao mesmo tempo, a educação terá de dar à juventude as capacidades para um novo mundo do trabalho – uma tarefa na qual o Brasil está visivelmente fracassando. Esse é um ponto crucial para que as empresas tenham o capital humano necessário para absorver novas tecnologias e fechar o ciclo do aumento da produtividade com mais inovação.

Crescimento sustentável

A fórmula para o crescimento, portanto, é uma somatória de maior abertura comercial, redução de barreiras à concorrência, aumento do investimento e da inovação. E ela precisa ser construída com a mentalidade da sustentabilidade típica do século 21. O desenvolvimento não virá do uso irresponsável de recursos naturais, nem da redução da biodiversidade, mas sim do acúmulo do conhecimento.

Assim, é possível crescer e, ao mesmo tempo, preservar extensas áreas florestais na Amazônia, respeitar ecossistemas frágeis e únicos, construir redes de saneamento nas grandes cidades e reduzir as emissões. Esses são compromissos plenamente em harmonia com o objetivo final do crescimento da renda de um país: dar mais qualidade de vida à sua população.