Tudo sobre o Júri de Carli Filho

Tudo sobre o processo de júri popular do caso do acidente envolvendo o ex-deputado Luiz Fernando Ribas Carli Filho, como é o Tribunal do Júri, o sistema de jurados, possíveis resultados, o papel dos envolvidos e a sequência de acontecimentos no dia do julgamento.

Data: 27 e 28 de fevereiro de 2018




Tribunal do Júri


Curitiba - PR


R. Ernâni Santiago de Oliveira, 268 - Centro Cívico

Mapa do tribunal

Mesa do juiz

foto: Alexandre Mazzo / GP

Mesa dos jurados

Cada jurado tem um computador para analisar o processo

foto: Alexandre Mazzo / GP




O réu e as testemunhas

São chamados para sentar nesta cadeira em frente à mesa do juiz

foto: Alexandre Mazzo / GP

O fato

Na madrugada do dia 7 de maio de 2009, uma colisão na esquina das ruas Monsenhor Ivo Zanlorenzi com Paulo Gorski, no Mossunguê, entre um Passat blindado, dirigido por Luiz Fernando Ribas Carli Filho, e um Honda Fit, resultou na morte de Gilmar Rafael Yared e Carlos Murilo de Almeida.

Veja as matérias da Gazeta do Povo sobre o caso

Quem é quem

O réu | Luiz Fernando Ribas Carli Filho

O ex-deputado estadual Luiz Fernando Ribas Carli Filho, à época com 25 anos, se envolveu numa colisão de trânsito ao dirigir em alta velocidade, embriagado, e com a carteira de motorista suspensa.

Veja como foi a vida dele nos últimos nove anos.

Juiz | Daniel Ribeiro Surdi de Avelar

Tem dez anos de experiência presidindo sessões de júri. Ele não julga se o acusado deve ser condenado ou absolvido. Em caso de condenação por dolo eventual, faz a dosimetria da pena.

Entenda o que é isso clicando aqui.

Os jurados

O conselho de sentença, que avaliará se Carli Filho é responsável por homicídio com dolo eventual (quando assume o risco de matar) é formado por sete jurados, escolhidos entre os moradores de Curitiba de forma a manter uma proporção com o perfil dos habitantes da cidade.

Veja como foi a seleção dos jurados.

As testemunhas

Na oitiva, são esperados onze depoimentos, arrolados tanto pela defesa como pela acusação. Christiane Yared, mãe de uma das vítimas, será ouvida no júri.

Saiba quem vai falar durante o julgamento.

O público

Senhas

No dia 23 de fevereiro, o Tribunal de Justiça distribuiu 200 senhas para os interessados em acompanhar o júri.

A procura foi grande e senhas provisórias foram entregues para que as pessoas não ficassem esperando em vão.

Veja aqui como as senhas acabaram antes e causam indignação

Perfil

Na maioria, são estudantes de Direito, mas também há muitos curiosos, interessados em acompanhar o desfecho do caso.

Conduta

Não são permitidas faixas ou camisetas de protesto nem qualquer tipo de manifestação durante o julgamento.

Imprensa

Também foram reservadas 25 vagas para a imprensa.

Como funciona

Passo a passo do júri, começando no dia 27 de fevereiro às 13 horas, na ordem dos acontecimentos

Às 13 horas do dia 27 de fevereiro, a primeira medida será verificar se estão presentes ao menos 15 entre os 45 potenciais jurados sorteados anteriormente. Se o número for menor que 15, o julgamento pode ser imediatamente cancelado. Contudo, os convocados que faltarem sem justificativas podem ser multados (geralmente o valor é de um salário mínimo). Confira aqui como foram selecionados os jurados.

Caso estejam presentes ao menos 15 jurados, um oficial de Justiça vai até a porta do Tribunal do Júri e apregoa as partes. Significa que, em voz alta, ele irá anunciar que ali acontecerá um júri e quem são os envolvidos.

Aí começa o sorteio para definir o conselho de sentença, os sete jurados que decidirão o veredicto. De modo eletrônico, o primeiro nome é selecionado. A pessoa se levanta e acusação e defesa podem, sem apresentar qualquer motivo, dizer que não querem aquela pessoa entre os jurados. Cada lado tem direito a dispensar três sorteados.

Certamente, a vida pregressa de todos os 45 selecionados previamente já foi analisada pelas partes, que investigaram o comportamento nas redes sociais, por exemplo. Assim, se alguém tem uma postura mais crítica, ou já postou que beber e dirigir é crime, tem muita chance de ser dispensado pela defesa. A acusação já informou que prefere um corpo de jurados formado por mães.

Caso alguém tenha relação direta com o caso (é amigo de alguém envolvido diretamente, por exemplo ou tornou público que havia sido selecionado e que condenaria ou absolveria o réu), defesa e acusação podem alegar suspeição ou impedimento e a pessoa sai da lista de jurados possíveis.

Selecionados os sete integrantes do corpo de sentença, eles fazem um juramento e, em seguida, o juiz explica como funcionará o júri. Os jurados não podem conversar entre si sobre o assunto e ficam incomunicáveis (sem acesso a telefones e internet, por exemplo). Mas eles ganham um tempo para consultar, no computador, o processo.

Aí começa a oitiva das testemunhas. Se a pessoa tem relação com os envolvidos, como é o caso de Christiane Yared, mãe de um dos jovens mortos, é tratada como informante e não há juramento. Estão previstos os depoimentos de onze testemunhas. A acusação pergunta primeiro e depois é vez da defesa. Não há tempo estabelecido para isso.

Se a testemunha foi arrolada pelos dois lados, sempre começa com a acusação, para a última ser a defesa. Somente nos casos em que a testemunha foi arrolada pela defesa é que é a primeira a perguntar. O juiz só faz perguntas caso algo tenha ficado dúbio e precise ser esclarecido. Caso estejam arrolados peritos oficiais, eles são os últimos a depor. Por último, podem ocorrer acareações (pessoas com depoimentos contraditórios são colocadas frente à frente para apresentarem suas versões).

A fase seguinte é o interrogatório do réu. Contudo, o acusado não é obrigado a estar presente. Depende da estratégia de defesa, que define se é interessante ou não. No caso de Carli Filho, não há qualquer informação da defesa se ele irá ou não ao julgamento.

Caso o réu esteja presente, o juiz faz perguntais sociais ao réu. Questiona a idade, a religião, se tem filhos, quanto ganha. Essa fase serve para que os jurados conheçam o réu. Em seguida, o juiz faz perguntas sobre os fatos.

O juiz informa ao acusado que ele tem o direito de ficar quieto (sem responder nenhuma pergunta ou só algumas), sem que isso possa ser usado contra ele no julgamento. Na sequência, o réu é inquerido pela acusação (e pela assistência de acusação) e depois pela defesa. Não há limite de perguntas ou tempo mínimo e máximo para isso.

Começa então a etapa de debates. A acusação terá 1h30 para apresentar seus argumentos. A promotoria pode ceder tempo para a assistência de acusação (advogados contratados pela família das vítimas). Depois é a vez da defesa, que terá igualmente 1h30. Se a acusação quiser, pode pedir uma hora de réplica e, assim, a defesa terá também uma hora de tréplica.

É proibido durante o debate, sob pena de nulidade do júri, fazer referência a decisões judiciais anteriores sobre o caso, mencionar as algemas do acusado, falar sobre o eventual silêncio do réu no depoimento, ler ou exibir documentos ou objetos que não tenham sido juntados ao processo até três dias antes do júri.

A fase seguinte é a decisão dos jurados. O juiz faz uma série de perguntas – a estimativa é que sejam dez, cinco referentes a cada vítima. Primeiro, sobre a existência dos fatos (se cada vítima estava no momento e no local citados). Os jurados usam cédulas para responder sim ou não.

A pergunta seguinte é relacionada à autoria. Assim, será questionado se Carli Filho estava no local e momento citados. Novamente, os jurados recebem cédulas com as palavras sim e não e depositam na urna aquela que expressa a decisão que cada um tomou. A outra cédula é colocada numa urna de descarte.

O juiz apura os votos até encontrar maioria. Assim, não há sete a zero. Esse procedimento ajuda a manter o sigilo dos votos, pois é impossível saber o que cada integrante decidiu.

Na sequência, o juiz pergunta se houve dolo eventual – ou seja, se o acusado assumiu o risco de causar as mortes. Caso a maioria dos jurados diga que não, o júri acaba – pois se não for caso de homicídio doloso, a competência para julgar é de um juiz. Assim, o processo será recomeçado na vara de delitos de trânsito.

Se os jurados, por maioria, considerarem que o acusado assumiu o risco de causar as mortes, o juiz perguntará se eles absolvem o réu. Essa pergunta é obrigatória, de acordo com a legislação.

Caso Carli Filho seja condenado por dolo eventual, o juiz fará a dosimetria da pena: vai usar diversos aspectos da lei para definir qual o tempo de prisão. Para cada morte, o tempo varia entre 6 e 20 anos.

Se o magistrado considerar que houve concurso formal (jargão no direito que significa uma ação que produziu dois resultados), a pena não é somada automaticamente e sim aumentada de 1/6 a metade. Assim, a pena mínima passaria a ser de 7 a 30 anos de prisão.

O regime fechado – ou seja, prisão sem direito a sair durante o dia – só acontece quando a pena é superior a 8 anos. E mesmo que Carli Filho seja condenado, ele não sairá preso do tribunal. Terá o direito de recorrer em liberdade.

Possíveis resultados

Absolvido

Caso a maioria dos jurados considerem que Carli Filho não teve qualquer culpa ou responsabilidade na morte dos dois rapazes.

Responsável por homicídio culposo

O próprio juiz que conduz o júri determina a sentença de Carli Filho.

Se for considerado culpado, pode pegar de 2 a 4 anos de prisão para cada uma das duas mortes.

Condenado por homicídio com dolo eventual

Se a maioria dos jurados considerar que Carli Filho assumiu o risco de matar, ele pode ser sentenciado a penas que variam de 6 a 20 anos, referentes a cada uma das mortes.

Caso o juiz, ao fazer a dosimetria da pena, considerar que um ato produziu dois resultados (a ação do trânsito causou as duas mortes), a pena pode chegar de 7 a 30 anos de prisão.

Somente se aplica regime fechado em caso de punições superiores a 8 anos.

Vocabulário

Para entender melhor o "juridiquês" usado durante o júri


Desclassificação
quando uma acusação inicialmente mais grave é “rebaixada”. Assim, a acusação de homicídio com dolo eventual pode ser desclassificada para homicídio culposo, que tem pena bem menor.


Culpa consciente
matar alguém no trânsito, mesmo que sem intenção, caracteriza culpa. Contudo, quando alguma atitude do motorista contribuiu para causar a morte, essa situação é chamada de culpa consciente. Então, se o limite de velocidade na via é 60 km/h e o carro estava a 90 km/h, por exemplo, o motorista agiu de forma imprudente e tem uma responsabilização proporcional às decisões que tomou.


Dolo eventual
Dolo significa agir intencionalmente para um determinado resultado. Quando alguém sai de casa com uma faca, decidido a matar alguém, trata-se de homicídio doloso. No trânsito, pode ocorrer o dolo eventual. Ou seja, a pessoa não queria matar especificamente alguém, mas, ao agir de forma imprudente e perigosa, aceitou o risco de que isso poderia acontecer. A legislação não estabelece uma linha clara dividindo culpa consciente e dolo eventual, mas as penas para cada crime são bem diferentes: de 2 a 4 para o primeiro e de 6 a 20 para o segundo.


Dosimetria
o cálculo da pena é bastante complexo e leva em conta uma série de situações, que podem ser agravantes, atenuantes, qualificadoras, entre outras expressões do mundo jurídico. Em resumo, se a maioria dos jurados considerar que o réu deve ser condenado por homicídio com dolo eventual, o juiz terá de considerar diversos fatores, como a vida pregressa do acusado (se já foi alvo de outros processos criminais) para calcular a pena.

EXPEDIENTE

Apuração e Reportagem - Katia Brembatti e Felippe Aníbal

Edição - Bruna Maestri Walter e Fabiano Klostermann

Gerente de conteúdo local - Audrey Possebom

Fotografia - Alexandre Mazzo

Editor de infografia - Guilherme Storck

Infográficos e webdesign - Chantal Wagner

Diretor da Redação - Leonardo Mendes Júnior